A serviço dos que precisam

Leiga Missionária presta trabalho voluntário com dependentes químicos em Iguape, SP.

Por Dalgi Vivan

Mais uma reunião ordinária dos LMC-SP na casa regional das Irmãs Missionárias da Consolata. Estudando do subsídio nº 31 – Ide pelo mundo inteiro...proclamai o evangelho..., vi-me diante da seguinte expressão: “Estender a mão a um mendigo para mendigar”. Quantas perguntas diante dela: O que faço do meu trabalho voluntário na Fazenda da Esperança de Iguape? Trabalhei 28 anos como educadora no Colégio Consolata e quando o Frei Hans me fez o convite para esse trabalho achei que “tiraria de letra” diante da minha experiência anterior. Ledo engano. Trabalho duas vezes por semana o dia todo lá. Faço o trabalho de secretaria, atendo os familiares por telefone e “gasto o maior tempo em atender os acolhidos”. O que já fiz como profissional e como cristã engajada em movimentos sociais não me deram ferramentas para o convívio com os adictos (dependentes químicos). O que faço diariamente é “estender a mão a um mendigo para mendigar”... Nos meus colóquios com os acolhidos “mendigo” o pão do entendimento desse novo panorama que se descortina diante de mim.

DSC02680Quem são eles? Que tipo de convívio familiar tiveram? Como foi sua educação e formação?
Perguntas e mais perguntas que busco respostas diariamente nas conversas e no meu apego a Deus e à Consolata. Como gosto muito de jardinagem e horta, sempre convido um deles para me ajudar e é nessas horas que a conversa flui e o desabafo vem. Choro com eles. Dou colo e muitas vezes uso palavras duras para que eles sintam que os amo, mas não posso aceitar a ação errada deles. Digo sempre: “Te amo, mas não gosto desse teu comportamento”. Tem dado muito certo essa dinâmica, pois o meu relacionamento com eles é muito bom. O abraço e o beijo são fundamentais e sinto que é a partir daí que eles começam a se abrir comigo.

Nunca perguntei o motivo de eles estarem lá. Quando eles se sentem confortáveis comigo; se abrem.
Eles vem de diferentes classes sociais, com diferentes formações religiosas, e o que mais me assusta é a tenra idade que se iniciam neste mundo das drogas: a grande maioria dos 11 anos em diante. Uma criança que os pais nem imaginam o que fazem. Tenho lido muito material, vejo reportagens e procuro conversar sobre o assunto com pessoas mais informadas que eu. É nas conversas com eles que me vejo diante de um mundo totalmente novo e desconhecido pela maioria da nossa sociedade. Roubar, matar é assunto corriqueiro. Quando pergunto: Você não tem pena de invadir uma casa para tirar o que eles conquistaram com o seu trabalho? A resposta é: o “nóia” não pensa mais, ele só quer mais e mais dinheiro para a droga e não importa onde buscar. Tem dias que eu digo: Chega! Não me conte mais nada hoje, pois a minha cabeça e coração não suportam.

É o leproso do século 21, que ninguém quer ter contato e que os governantes ignoram.
Aprendi também que tenho que fazer o máximo quando estou com eles, pois o abandono do tratamento é uma constante e conviver com a decepção é um exercício diário. Quando um deles me diz que vai embora inventando mil desculpas, sei que é a abstinência das drogas e do sexo o motivo principal. À medida que o tempo vai passando, começa a alegria de ver acolhidos cultivando a espiritualidade e, consequentemente, o convívio e o trabalho se tornam harmoniosos. Quando se aproxima a data da saída - 1 ano de tratamento - são eles que, na sua maioria, sentem pesar em deixar a Fazenda. Dizem que aprenderam a conviver com o diferente, respeitar o espaço do outro, mas principalmente desenvolver a espiritualidade. O terço é diário, missa 2 vezes por semana, adoração ao Santíssimo, palavra de vida, troca de experiências.

Setembro teremos quatro acolhidos que estão completando esta etapa e eu já sinto aperto no coração com a partida deles. Não tem como não se envolver; é um filho que busca o seu caminho agora fortalecido com tudo o que recebeu da Fazenda: ser um novo homem cultivando a espiritualidade diária.